13 de outubro de 2005, data que deve e necessita ser comemorado pela comunidade laboratorial. Os acontecimentos gerados a partir desse dia enfatizam de modo claro e transparente todas as mudanças de paradigmas nos sistemas de gestão laboratorial, conferindo ao setor a distinção, a dignidade, a responsabilidade e o reconhecimento da importância do laboratório clínico na área da Saúde.
Nessa data foi publicada a RDC 302 da ANVISA.
Havia premência, por todos desejada, ávidos por uma regulação que ordenasse todo o sistema, mesmo que inicialmente impusesse algumas dificuldades de implantação, mas que ao final todos pudessem comemorar as melhorias na atenção, na qualidade técnica e fundamentalmente na confiabilidade dos laudos. Haviam convicções, todos sabiam, que esses avanços trariam ao setor elevações nos custos de trabalho e manutenção, porém valeria a pena correr este risco.
Todas as entidades do contexto laboratorial colaboraram vigorosamente na sua elaboração, pois havia plena consciência de que o setor necessitava de ordenações que pudessem estar ao alcance de todos aqueles gestores comprometidos com os conceitos de qualidade.
A comprovação veio pelo fato de que os laboratórios que cumprem todos preceitos da RDC 302 estão acreditados ou em fase de acreditação.
Entretanto, passados 12 anos, em função de incorporações de novas tecnologias, de novos conceitos em gestão, mudanças em regramentos profissionais, o momento atual necessita e é propício a uma revisão da RDC 302-2005.
É a oportunidade, também para que sejam corrigidas algumas não conformidades de trajeto, algumas fundamentais, outras desejáveis.
Alguns exemplos:
O item 03 que tem o texto seguinte:
“Esta resolução de Diretoria Colegiada é aplicável a todos os serviços públicos ou privados, que realizam atividades laboratoriais na área de análises clínicas, patologia clínica e citologia”.
É importante frisar e deixar bem claro que os “eleitos” das fiscalizações, na maioria dos estados e municípios são os laboratórios privados. Não cabe aqui, neste texto, uma busca de razões ou causas. Se ideológicas ou deficiência no número de profissionais para a fiscalização. É apenas uma constatação incontestável, onde as exceções, que existem, confirmam a regra.
O item 6.2.6:
“O laboratório clínico deve monitorar a fase analítica por meio de controle interno e externo da qualidade”.
O número de laboratórios que participam de programas de controle de qualidade externo no país é de aproximadamente 7.500, dados fornecidos pelo PNCQ e Controlab, únicos a disposição de todos os laboratórios. Se esses dados forem confrontados com os do CNES ou do INSS conclui-se que pelo menos 2.500 laboratórios no país não fazem controle de qualidade e estão em funcionamento, pois constam desses dados oficiais, o que representa atividade plena.
Se estão em atividade, devem possuir alvará sanitário, obtido evidentemente sem a apresentação de declaração de participação ou avaliação de desempenho das entidades responsáveis pelos respectivos programas.
A redação do texto da RDC existe e é muito clara, portanto a fiscalização é insuficiente ou ineficiente.
Os itens:
6.2.13
“A execução dos Testes Laboratoriais Remotos – TLR (point of care) e de testes rápidos, deve estar vinculada a um laboratório clínico, posto de coleta ou serviço de saúde pública ambulatorial ou hospitalar”.
6.2.14
“O Responsável Técnico pelo laboratório clínico é responsável por todos os TLR realizados dentro da instituição, ou em qualquer local, incluindo, entre outros, atendimento em hospital-dia, domicílios e coleta laboratorial em unidade móvel”.
6.2.15
“A relação dos TLR que o laboratório clínico executa deve estar disponível para a autoridade sanitária local”.
6.2.15.1
“O laboratório clínico deve disponibilizar nos locais de realização de TLR procedimentos documentados orientando com relação às suas fases pré-analítica, analítica, e pós analítica, incluindo:
– sistemática de registro e liberação de resultados provisórios
– procedimento para resultados potencialmente críticos
– sistemática de revisão de resultados e liberação de laudos por profissionais habilitados”
6.2.15.2
“A realização de TLR e dos testes rápidos está condicionada à emissão de laudos que determine suas limitações diagnósticas e demais indicações estabelecidas no item 6.3”.
6.2.15.3
“O laboratório clínico deve manter registros dos controles de qualidade, bem como procedimentos para a realização dos mesmos”.
6.2.15.4
“O laboratório clínico deve promover e manter registros de seu processo de educação permanente para os usuários dos equipamentos de TLR”.
Neste conjunto de itens estarão centrados os maiores eixos de discussões.
É do mais amplo conhecimento de que as novas orientações profissionais do Conselho Federal de Farmácia transformando a farmácia tradicional em estabelecimento de saúde acarretará mudanças sensíveis na morfologia, na forma de atendimento e nas atribuições das farmácias.
Estas implantações estão sendo aceitas com uma quase unanimidade pela profissão farmacêutica. Os serviços de atenção incluirão a consulta farmacêutica, com orientações sobre farmácia clínica, utilização correta das formas farmacêuticas, prescrição no âmbito de sua competência, aplicação de vacinas e execução de testes laboratoriais remotos.
Está mais do que evidente que esta nova atribuição dos estabelecimentos farmacêuticos confronta o texto da RDC 302 onde, no seu item 6.2.13 está claramente expresso que “a execução dos TLR deve estar vinculada a um laboratório clínico, posto de coleta, ou serviço de saúde pública, ambulatorial ou hospitalar”.
Os demais itens referem-se a registros, competência sobre laudos, controle de qualidade, que certamente deverão ser conduzidas e delegadas aos Farmacêuticos responsáveis técnicos das farmácias.
Portanto, esses itens, além de continuar sendo mantidos na RDC 302, pois os laboratórios clínicos também executam TLR, deverão constar de modo claro e didático nas resoluções oficiais que orientarão os serviços de atenção farmacêutica.
Da mesma forma, as organizações que realizam os testes de proficiência dos laboratórios clínicos deverão estar preparadas para estender a sua prestação de serviços às farmácias.
Deverá ser colocado em destaque, também a apreciação do artigo terceiro a RDC 302 explicita:
“As Secretarias de Saúde Estaduais, Municipais e do Distrito Federal devem implementar os procedimentos para adoção do Regulamento Técnico estabelecido por esta RDC, podendo adotar normas de caráter suplementar, com a finalidade de adequá-lo às especificações locais”.
O artigo terceiro possibilita às VISAS estaduais e municipais a introdução dos maiores “absurdos regulatórios”, quer por falta de conhecimentos técnicos, ou por conveniências municipais, estritamente locais. Algumas fazem uso desse expediente de forma quase cruel. É imperiosa a criação de um canal de informações e esclarecimentos com a finalidade única sanar essas ocorrências que, lamentavelmente, são muito mais frequentes do que se poderia imaginar.
Por derradeiro, é importante deixar registrado de que todas as entidades que atuam no setor laboratorial, SBAC, SBPC/ML, ABBM, ABRAMED, CNS, Conselhos Profissionais juntamente com os seus Grupos de Trabalho em Análises Clínicas sempre conferiram todo o apoio e contribuições à RDC 302, mesmo tendo conhecimento que a introdução de todos os seus itens na rotina laboratorial acarretaria um alto custo de implantação e manutenção.
Nunca houve reconhecimento por parte das entidades públicas e privadas que adquirem serviços laboratoriais, e que insistem em congelar honorários, alguns há mais de 20 anos.
Portanto, não é demasia solicitar à ANVISA, mesmo que não seja da sua competência, que informem e recomendem aos compradores dos serviços laboratoriais de que qualidade é absolutamente necessária e indispensável, mas que, entretanto, existem custos que não se sabe até quando serão suportados.