Estudo realizado na Universidade de Örebro (Suécia) identificou padrões específicos de proteínas no sangue que podem identificar a ocorrência de Doença Inflamatória Intestinal (DII) até 16 anos antes de surgirem os sintomas e obter um diagnóstico. A DII compreende a doença de Crohn (DC) e a retocolite ulcerativa (RU), também chamada colite ulcerativa.
No trabalho foram analisadas 780 amostras de sangue obtidas em bancos de dados de saúde da Suécia. Através de aprendizados de máquina e aplicação de métodos matemáticos e estatísticos, os pesquisadores identificaram padrões de proteínas que separam indivíduos saudáveis daqueles que desenvolvem DC ou RU.
Segundo os autores, na coorte de descoberta, uma assinatura de 29 proteínas diferenciou casos pré-clínicos de DC dos controles, com uma área sob a curva (AUC, na sigla em inglês) de 0,85. Seu desempenho foi confirmado na validação pré-clínica (AUC=0,87) e na coorte inicial (AUC=1,0). Em amostras pré-clínicas, proteínas reguladas negativamente – mas não reguladas positivamente – que têm relação com a integridade da barreira intestinal e com as funcionalidades dos macrófagos se correlacionaram com o tempo até o diagnóstico de DC.
O resultado não foi tão promissor quando analisaram os dados para RU. A assinatura pré-clínica mostrou uma capacidade preditiva significativa, embora menor, com AUC=0,77. Na validação pré-clínica a AUC encontrada foi 0,67 e na coorte inicial os pesquisadores registraram AUC=0,95. Mesmo assim, os autores consideram que existe uma conexão clara entre mudanças nos padrões de proteínas e o início futuro da RU, apesar de não ser tão forte e marcante como na DC.
“Ao descobrir esses marcadores muito antes que os sintomas se manifestem, podemos potencialmente intervir mais cedo e, possivelmente, melhorar a qualidade de vida dos indivíduos que apresentam risco de desenvolver DII”, avalia Jonas Halfvarson, professor de gastroenterologia na universidade e coautor do estudo.
Segundo ele, os resultados também mostram que proteínas ligadas à função da barreira intestinal e ao sistema imunológico são essenciais para entender como a DII se desenvolve.
Prevalência no Brasil
Dados da Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP) indicam que mais de cinco milhões de indivíduos no mundo sofrem de DII. No Brasil, sua prevalência tem aumentado e atinge cerca de 10 pessoas a cada 100 mil habitantes. A doença não escolhe idade, apesar de ocorrer com maior frequência dos 15 aos 35 anos.
Segundo os pesquisadores de Örebro, a doença inflamatória intestinal é provocada por interações complexas entre uma série de fatores de risco genéticos e ambientais e resultam em uma resposta imunológica desregulada.
“Estudos recentes mostram que um diagnóstico de DII é precedido por um período pré-clínico, que se caracteriza por inflamação subclínica sistêmica, função de barreira interrompida, desenvolvimento de anticorpos para antígenos microbianos e potencialmente autoanticorpos” diz Halfvarson.
De acordo com ele, cerca de 30% a 40% dos pacientes com DC desenvolvem complicações como fístulas e estenoses intestinais detectadas no processo diagnóstico. Em alguns com RU pode ser necessário realizar uma colectomia – retirada parcial ou total do cólon.
“Isso demonstra a necessidade de diagnóstico e intervenção precoces. Muitos pacientes com DII não respondem completamente à medicação. Apesar dos avanços recentes nas opções de medicamentos, até o momento não existem terapias que consigam reverter a natureza progressiva dessa doença”, conta Halfvarson.
Por isso, acrescenta, é tão importante a descoberta de biomarcadores que possam detectá-la durante uma “janela de oportunidade” quando a desregulação imunológica é potencialmente reversível.
O artigo Preclinical protein signatures of Crohn’s disease and ulcerative colite: A nested case-control study within large population-based cohorts foi publicado online em 26 de novembro de 2024 no periódico Gastroenterology.