Tecnologia usa sensores robóticos para medir padrões de pulso do hormônio luteinizante
Pesquisadores do Imperial College London (ICL) e da University of Hong Kong (HKU) desenvolveram uma técnica que permite verificar, em tempo real, problemas de saúde que afetam o funcionamento do sistema reprodutivo feminino. A tecnologia apresentada no estudo foi usada para medir os padrões de pulso — elevação e queda — do hormônio luteinizante (LH, na sigla em inglês), mas também pode ser aplicada na avaliação de outros hormônios. O diagnóstico é obtido em tempo menor e a um custo inferior que os métodos atuais. O trabalho foi publicado em Nature Communications.
De acordo com os autores, o padrão de pulsos de secreção do LH na corrente sanguínea é muito importante para o funcionamento reprodutivo normal. Alterações nesse padrão podem provocar distúrbios como Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), amenorreia hipotalâmica e puberdade tardia ou precoce. As consequências podem ser infertilidade, síndrome metabólica e depressão.
Segundo os pesquisadores, o desafio para se obter o diagnóstico desses distúrbios reprodutivos é que as medições únicas de amostras de sangue não são suficientes para mostrar o padrão de pulsos de secreção do LH. Eles explicam que é necessário fazer a coleta de sangue periférico a cada 10 minutos durante, pelo menos, oito horas, e que a análise seriada por ensaio imunoquímico tem custo elevado pois requer muitas amostras por paciente.
“O diagnóstico de distúrbios reprodutivos que frequentemente causam infertilidade é um desafio antigo. Nosso estudo apresenta uma tecnologia inovadora que tem o potencial de transformar o diagnóstico através da medição repetida ou mesmo contínua de concentrações de hormônios e de outras biomoléculas”, diz Julian Tanner, professor associado da University of Hong Kong e coautor do trabalho.
Ele acrescenta que, atualmente, a maioria dos estudos que medem o padrão de pulsos de secreção do LH é realizada em grupos de humanos que participam de pesquisas clínicas especializadas ou em animais.
Abordagem nova
A técnica empregada é um sistema de análise eletroquímica batizado de Robotic APTamer-enabled Electrochemical Reader (RAPTER), que compreende um aptâmero — estrutura de RNA ou DNA de fita simples ou dupla com afinidade para alvos específicos —, sensores eletroquímicos que operam em uma plataforma robótica e um método matemático denominado Bayesian Spectrum Analysis (BSA). Segundo os autores, essa técnica representa uma abordagem inteiramente nova para determinar o padrão de pulsos do LH em mulheres com problemas reprodutivos.
O aptâmero foi desenvolvido especialmente para esse estudo porque era necessário que ele se ligasse especificamente ao LH e não a outros hormônios relacionados. Na presença do LH, o aptâmero muda de forma, o que provoca alterações nas propriedades elétricas em sua superfície. Como ele está integrado aos sensores, estes podem medir diretamente a concentração do hormônio em uma amostra de sangue. A plataforma robótica permite que centenas de amostras sejam medidas ao mesmo tempo. A aplicação do método matemático BSA possibilita determinar o padrão de pulsos do LH em diferentes cenários clínicos.
O estudo foi realizado entre 2015 e 2019, no Hospital Hammersmith do ICL. O RAPTER foi utilizado para medir os padrões de pulsos de LH de 441 amostras de sangue de grupos de mulheres com três condições diferentes: função reprodutiva normal, menopausa e amenorreia hipotalâmica. No segundo grupo, os níveis de LH são elevados, em comparação com mulheres férteis saudáveis, enquanto as que têm amenorreia hipotalâmica possuem níveis baixos de LH. De cada participante foram colhidas 49 amostras, medidas a cada dez minutos, durante oito horas, e os resultados fornecidos imediatamente.
Para comparar o desempenho do RAPTER, as mesmas amostras também foram analisadas usando o método clínico atual padrão ouro (ensaio imunoquímico) para medição de LH e FSH. De acordo com os autores, os resultados obtidos com o RAPTER são comparáveis e têm como vantagens um custo inferior, menor uso de reagente e configuração mais simples porque dispensa reagentes extras para cada medição do ponto de concentração.
Além disso, a plataforma é adaptável para multiplexação ou implantação para monitoramento contínuo, os sensores não exigem lavagem, separações, etapas cromatográficas nem equipamentos caros.
Medicina personalizada
De acordo com Waljit Dhilo, coautor e professor de Pesquisa em Endocrinologia e Metabolismo do Imperial College London, essa tecnologia pode ser desenvolvida para fornecer aos médicos um quadro mais claro do padrão de pulsos do LH e sugerir tratamentos mais eficazes de acordo com as necessidades de cada paciente.
“Problemas de saúde reprodutiva em mulheres são comuns em todo o mundo. O diagnóstico de algumas dessas condições é demorado, o que resulta em atrasos no tratamento e pode afetar o bem-estar mental e físico das pacientes. Existe uma grande necessidade de novas e melhores maneiras de diagnosticar essas condições com maior rapidez. Nossa tecnologia é capaz de fazer isso e levar a tratamentos mais direcionados”, destaca Dhilo, que é chefe da Seção de Endocrinologia e Medicina Investigativa do ICL.
“Agora vamos trabalhar para tornar a tecnologia mais acessível para o uso clínico, reduzindo o tamanho do dispositivo. Isso poderá revolucionar o atendimento de pacientes com distúrbios reprodutivos ou outros problemas”, acrescenta Anthony Cass, coautor e professor de Biologia Química no Departamento de Química e no Instituto de Engenharia Biomédica do ICL.
Segundo os autores, este é um dos primeiros estudos em que se usou aptâmeros para diagnóstico em ambiente clínico. Em geral, são empregados anticorpos quando é necessário fazer medições específicas de biomoléculas, mas eles não podem ser utilizados continuamente.
De acordo com Shaolin Liang, coautor e aluno do programa de doutorado em conjunto entre o ICL e a HKU, os aptâmeros são ideais para tecnologias de sensoriamento contínuo, como em biochips implantados ou em adesivos com microagulhas.
“Portanto, esta pesquisa abre possibilidades significativas como a tecnologia subjacente para a detecção contínua de biomoléculas que poderia transformar o diagnóstico molecular”, conclui o doutorando.