Estamos na era da Medicina Personalizada: genômica, proteômica, metabolômica nos habilitam a realizar diagnósticos personalizados e de elevada especificidade, que muitas vezes resultam em tratamentos customizados para cada paciente. Estamos também imersos em uma intensa discussão sobre os modelos de operação da cadeia de valor em saúde, rediscutindo o papel de cada ente da cadeia e como as relações entre eles será reconfigurada num futuro próximo. Nesse contexto inovador, faz-se necessária também uma visão personalizada dos processos de operações técnicas em Análises Clínicas.
Para atingimento da eficiência clínica e máxima construção de valor, é importante que todas equipes envolvidas na operação entendam as necessidades dos diferentes clientes e possam ter acesso a dados em tempo real. Dessa forma, vê-se como um diferencial estratégico e operacional possuir um processo para as operações técnicas que auxilie a coletar, organizar, monitorar e compartilhar informações oferecendo suporte a gestão técnica e demais interessados (CRUZ; MIRANDA; TURCHETTE, 2014). Esse processo é chamado de Business Intelligence (Inteligência de Negócios) (BI) e torna possível a transformação de uma grande quantidade de dados brutos em informação útil, ajudando as empresas na tomada de decisões de forma rápida e estratégica.
As operações técnicas de Análises Clínicas são complexas pela variedade de processos distintos e inter-relacionados a serem controlados, e pela variedade de matrizes analisadas (sangue, urina, fezes, liquor, líquidos cavitários etc.). Pode-se dividir a operação em três fases: pré-analítica, envolvendo uma série de processos dependente da qualificação das amostras, preparo do paciente, tipo de coleta realizada, acondicionamento das amostras e condições de transporte; analítica, composta pelos produtos, materiais e serviços empregados na análise das amostras biológicas, pelo controle dos processos, pelas equipes especializadas realizando exames em equipamentos em ótimas condições de operação, e empregando recursos de tecnologia da informação de última geração; e pós-analítica, em que é realizada a interpretação clínica dos resultados e entrega do laudo para o médico e para o paciente (Adaptado de OLIVEIRA; MENDES, 2010).
Para que o nível de qualidade de todo processo seja garantido, é necessário ter controle sobre todas as etapas. No Grupo Fleury esse controle é realizado por meio de indicadores de todas as fases do processo, como por exemplo: índice de recoletas (fase pré-analítica), porcentagem de repetição do processamento da amostra (fase analítica), laudos não pontuais e laudos incorretos (ambos fase pós-analítica). Todos os indicadores que mensuravam a performance operacional em Análises Clínicas, antes da implantação do sistema de BI, eram preparados de forma manual (em Excel, com programação VBA, por exemplo), em painéis estáticos, pelo setor de Gestão de Operações Técnicas. Analisando o planejamento estratégico do Grupo percebeu-se que essa forma de conduzir os ciclos de disponibilização dos indicadores poderia ser aprimorada e agilizada. No formato anterior, havia geração de valor para a operação, porém os dados eram disponibilizados mensalmente, com uma baixa granularidade, fato que dificultava a investigação da causa raiz dos problemas em tempo real. Além disso, os dados eram organizados em painéis que apresentavam grande complexidade de informações, valorizando a visão por área processante de exame (hematologia, microbiologia, citogenética, etc) e não incorporando outras visões de clientes relacionados à rotina de Análises Clínicas.
Estabelecendo como diretrizes a geração de valor para o nosso cliente e para a operação, simultaneamente, instalou-se uma plataforma de BI, formatada e customizada in house (internamente, pela própria empresa) pela equipe do projeto. Os objetivos traçados foram:
– automatizar os indicadores, gerando informação diária para aceleração de tomada de decisão pela gestão (movimento mais ‘pró ativo e preventivo’ ao invés de ‘reativo’);
– identificar atividades que não agregavam valor ao processo e consumiam horas de trabalho da equipe;
– trazer para o dia a dia uma visão não apenas da sua operação, mas também dos demais clientes de Análises Clínicas, como Unidades de Atendimento, Unidades de Negócios e o cliente-paciente.
Seguindo os objetivos traçados, com a implantação do projeto BI conseguimos uma redução de 97% no tempo gasto para atualização de indicadores devido à automatização dos processos através da ferramenta. Essa ação garantiu ao setor de Gestão de Operações Técnicas uma redução de aproximadamente 100 horas/mês em atividades para publicação de informações; essas horas agora foram deslocadas para projetos de melhoria contínua focados em eficiência operacional e clínica das nossas operações, como por exemplo realização de projetos Lean nos setores para redução de atrasos, melhorando a experiência do nosso cliente.
Além disso, passamos a ter informações diárias dos indicadores, auxiliando gestores e analistas a identificarem, com maior velocidade, quais são os principais ofensores dos desvios de qualidade. Disponibilizamos alta granularidade de informações concentradas em uma única plataforma, o que permite análises específicas do problema, diminuindo a frequência com que se correlaciona diversas fontes de dados. A alta granularidade das informações aliada com a facilidade na identificação dos principais ofensores nos permitiu, por exemplo, a identificação de um tipo específico de exame realizado mais frequentemente aos finais de semana, cujo prazo de liberação era percebido como ‘inadequado’ pelos nossos clientes-pacientes (geração de insatisfação/reclamação). O ajuste de fluxo conduzido após essa investigação levou à nova customização de processo baseado na visão do cliente e à redução de 69,85% no atraso de resultados.
Por fim, agora contamos com uma visão colaborativa de todos os setores técnicos de Análises Clínicas (incentivando ainda mais a troca de experiências entre as áreas para aprimorar a gestão) e com uma visão de negócios (compartilhando dados da operação de Análises Clínicas com diversas áreas da empresa). Percebemos que, antes do projeto do BI, muitas vezes possuíamos problemas similares que eram resolvidos de forma paralela, sendo desprendido um grande esforço de diversos setores de forma independente e repetida. Com o BI, estimulamos uma visão sistêmica na resolução de problemas, reduzindo redundâncias nos projetos, reforçando a interdependência entre as áreas e potencializando a capacidade de realização. Com isso, conseguimos resolver mais problemas de forma multidisciplinar, aprimorando nossa qualidade técnica e contribuindo positivamente para a experiência dos nossos clientes.
O projeto BI em Análises Clínicas trouxe o futuro e a visão do cliente-paciente para a nossa gestão diária. A plataforma eleva nosso padrão de excelência e inovação, buscando meios de melhorar a experiência do cliente desde a recepção de suas amostras biológicas até a liberação do resultado em si. Como próximos passos pretendemos envolver mais stakeholders no projeto, desenvolvendo novos painéis voltados a informações preditivas e à eficiência clínica. Há potencial de troca de experiência e de expressiva contribuição para a discussão com os demais envolvidos na cadeia de saúde, o que amplia o potencial de geração de valor para além de nossas operações técnicas de Análises Clínicas.
Agradecimentos: registramos nosso agradecimento pelo valioso apoio durante a execução desse projeto à equipe de Análises Clínicas, em especial à Gestão Técnica, às Assessorias Técnica e Médica; ao Anderson Akihiro Kuwakino, à Leticia Abigail De Moura Martins, à Tatiane Cunha Agostinho e à equipe de Suprimentos/Compras/TI.
Bibliografia:
FREEMAN, R. E. Strategic management: A stakeholder approach. In: LAMB, R. (ed.). Advances in Strategic Management, v. 1. Greenwich: JAI Press, p. 31-60, 1983.
CRUZ, BRUNO CAMPANELLA; MIRANDA, BRUNO GABRIEL CORREA; TURCHETTE, FELLIPE BARRETTO . CONCEITOS DE BUSINESS INTELLIGENCE POR MEIO DE ESTUDOS DE CASO: FERRAMENTAS PENTAHO E QLIKVIEW. Itatiba: [s.n.], 2014. 17 p. Disponível em: <http://lyceumonline.usf.edu.br/salavirtual/documentos/2704.pdf>. Acesso em: 07 maio 2018.
OLIVEIRA, Carla Albuquerque de; MENDES, Maria Elizabete. Gestão da Fase Analítica do Laboratório: como assegurar a qualidade na prática. 1ª Edição Digital. ed. Rio de Janeiro: Control Lab, 2010. 10 p. v. I. Disponível em: <https://controllab.com/pdf/gestao_fase_analitica_vol1.pdf>. Acesso em: 07 maio 2018.
Autores: Mauricio Guerino Minatel; Jessica Daudt Silva; Rafael Sales de Pinho; Leticia Martins Sanches; Patricia Isquierdo Moreno Vargas; Felipe Janpaulo Muramoto; José de Sá; Andressa Matos; Antônia de Oliveira Yoshikawa; Karla Ryuko Abe Costa; Maria Emilia Germani Moura; Flavia Helena da Silva; Gustavo Stuani Guimaraes; Edgar Gil Rizzatti. (Gestão de Operações Técnicas de Análises Clínicas, TI – Área Técnica e Área de Projetos, Coordenação e Gerência Técnica de Análises Clínicas, Diretoria Executiva de Operações Técnica e Médica. Grupo Fleury)